terça-feira, novembro 30, 2010

Hans Hoekendijk

Hans Hoekendijk

SEU NOME ERA Hans Hoekendijk que se pronuncia "rukendaik". Teria, aproximadamente, 60 anos. Com uma vasta cabeleira de cabelos grisalhos abundantes, seu rosto inspirava tranquilidade, seus olhos azuis eram tristes, sua voz em sussurro revelava mansidão e o cachimbo era, talvez, seu amigo mais íntimo.
 
De um cachimbo pode-se dizer "meu cachimbo". Mas nunca dizer "o meu cigarro". Lembrando-me dele tenho saudades do tempo em que eu fumava cachimbo. O cachimbo é uma amizade fiel e vagarosa. Ele era meu colega na instituição em que ensinávamos. Holandês, lutara na resistência contra os alemães durante a Segunda Guerra Mundial e estivera preso num campo de concentração nazista. Reuníamos-nos à sua volta para ouvir suas histórias.
 
Essa foi a que mais me impressionou. "Tínhamos um rádio clandestino", ele falou. "De noite acompanhávamos as notícias do "front" de batalha. As forças aliadas haviam desembarcado na Normandia e avançavam rapidamente na direção do campo em que estávamos presos. Fazíamos os cálculos. Avançando naquele ritmo dentro de poucos dias estaríamos livres!
 

Foi quando o comandante do campo nos reuniu a todos no pátio. "Sei que todos estão se alegrando, pensando que dentro de poucos dias estarão livres. Estão enganados. Antes que cheguem as tropas todos vocês serão enforcados!'"
 
Ele fez uma pausa no seu relato, comprimiu o fumo de seu cachimbo, deu umas baforadas perfumadas -a fumaça fazendo suas espirais-, e, então, continuou: "Um grito de horror saiu da boca de todos. Tão próxima a liberdade e tão longe."
 

"Aí", ele continuou, "passada a experiência de medo e horror, eu tive a maior experiência de liberdade de toda a minha vida. Se vou morrer dentro de dois dias e não há nada que eu possa fazer para evitar a morte, eu sou completamente livre para fazer e dizer o que quiser pois nada pior que a morte poderá me acontecer.
 
O medo se foi... Olhei então para aquele guarda alemão, metralhadora a tiracolo, bruto e sem compaixão, que sempre me amedrontara. Agora eu posso ir até ele e dizer tudo o que penso e sinto a seu respeito. Que me pode fazer? Dar-me uma rajada de metralhadora? Melhor morrer assim que morrer enforcado.
E aquela mulher -eu sempre a amei de longe, só com meus olhos. Ah! Os olhos... Os prisioneiros também amam e sonham... Eu nunca havia me aproximado dela. Ela era casada. Mas, agora, nós três -eu, ela e o marido- tínhamos um mesmo destino. Iríamos morrer. Senti que podia me aproximar dela e, na presença do marido, confessar meus sentimentos.
 
Não, não se tratava de um convite à infidelidade. Diante da morte a infidelidade não existe. Era apenas uma revelação de amor. E nos abraçamos..."
 
Ele se calou, limpou o cachimbo, enfiou-o no bolso, ficou mudo por alguns segundos e então terminou seu relato. "Mas aí nós não fomos enforcados. As tropas aliadas nos libertaram. Voltei, então, à vida normal, voltei a ter medo e perdi minha liberdade..."


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Experimento norte-americano testa como reverter envelhecimento

Uma técnica para manter saudável a estrutura dos cromossomos pode reverter o envelhecimento dos tecidos.

Mariela Jaskelioff e colegas do Instituto de Câncer Dana Farber Cancer, em Massachusetts (EUA), conduziram um experimento com camundongos programados com telômeros curtos e telomerase inativa para ver as consequências dessa combinação.

O resultado é que os animais tiveram um período de vida curto, órgãos atrofiados e cérebros menores que aqueles que não haviam sido programados.

Os telômeros, que ficam nas extremidades dos cromossomos, diminuem a cada divisão celular, mas as células param de se dividir e morrem quando eles ficam abaixo de um certo comprimento.

Cabe à enzima telomerase retardar essa degradação adicionando um novo DNA na ponta dos telômeros.

Quatro semanas depois de os cientistas tornarem a telomerase dos camundongos ativa, eles detectaram que o tecido se regenerou em diversos órgãos, nova células cerebrais se desenvolveram e a vida dos camundongos foi prolongada.

A pesquisa, em fase experimental com animais, é mais uma evidência das relações entre o comprimento dos cromossos e as doenças relacionadas à idade, que pode levar à aplicação em seres humanos no futuro.


Notícia da New Scientist, na Folha.com

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segunda-feira, novembro 29, 2010

Contra a tortura


Contra a tortura

LONDRES -QUEM está cansado de Londres está cansado da vida. Obrigado, Dr. Johnson. Acordo num domingo perfeito -cinzento, frio, chuvoso-, no quarto de sempre do meu amado e velhinho Dukes. Ao longe, escuto nove badaladas no Big Ben. E, antes de me lançar selvaticamente ao café da manhã que promete estourar com o meu colesterol, passo os olhos pelo "Telegraph". Para ler Janet Daley, um das minhas prosadoras favoritas.
 

O assunto de hoje é sério: tortura. Conta Daley que o premiê britânico, David Cameron, criticou George Bush sobre o assunto. Parece que Bush, com a sutileza que todos lhe reconhecemos, defendeu o uso de certas "técnicas coercivas" para combater o terrorismo e extrair informações de prisioneiros. Como o "waterboarding", uma forma de encharcar o suspeito, simulando afogamento. Disse Bush que técnicas como essa impediram vários ataques em solo britânico.
 

Cameron não comprou a ideia. Disse que era impossível provar tal coisa. E depois avançou com duas proposições de peso. Primeiro: a tortura é moralmente errada. E, depois: é inútil: nunca fornece informação relevante ou decisiva.
 

Janet Daley acerta em cheio ao apontar a natureza contraditória das afirmações de David Cameron. Porque, se a tortura é moralmente errada, não vale a pena acrescentar a sua presumida inutilidade. "É pior que um crime; é um erro", dizia o cínico e realista Talleyrand (1754-1838). Será Cameron um cínico igual? Duvidoso. Melhor ficar pelo imperativo moral. O imperativo moral chega.
 

O problema é que os imperativos morais nunca chegam, escreve Daley. E raramente sobrevivem à realidade. Mentir é errado? Certo. Mas quem não mentiria para salvar a pessoa que ama? "Entre a justiça ou a minha mãe, escolho a minha mãe", dizia Albert Camus (1913-1960). Eu também. E que me perdoe o sr. Immanuel Kant (1724-1804).
 

Mas existem princípios morais e princípios morais. "Mentir" e "torturar" não habitam a mesma categoria -e aqui afasto-me de Daley, que recorre ao dilema clássico sobre a necessidade da tortura na proteção das liberdades e vidas humanas.
 

Imagine o leitor: o suspeito tem informação relevante sobre a bomba; a bomba irá provocar incontáveis mortes; devemos torturá-lo de forma a extrair informação que salvará todas essas vidas?
 

Melhor ainda: se a tortura é um atentado aos direitos humanos, que dizer dos direitos humanos de todas as vítimas que o poder político foi incapaz de proteger, torturando um só suspeito?
 

Entendo o dilema. Acontece que o dilema não é propriamente um dilema, é uma armadilha. Toda a formulação está já construída para uma resposta positiva. Se o suspeito sabe; se o suspeito se prepara para matar; se a confissão do suspeito pode impedir o massacre de inocentes, então será mais fácil tolerar um aperto aqui, uns choques acolá, uma simulação de afogamento a seguir. Tudo em nome do bem comum.
 

Infelizmente, uma armadilha não nos leva longe. Um suspeito não passa disso: um suspeito. Jamais saberemos, com rigor e certeza inabaláveis, se temos na nossa frente a chave da ameaça. Podemos ter um cúmplice -ou não. Podemos ter um inocente -ou não. Existe uma diferença moralmente decisiva entre o que julgamos poder saber -e o que saberemos depois do serviço feito.
 

Bem sei que, em todos os países do mundo, e em particular nos países ocidentais, a tortura policial continua a ser praticada portas adentro. E seria ingenuidade acreditar que lições de ética seriam capazes de alterar essa aberração.
 

Mas não custa tentar: a civilização em que vivemos só foi possível pela renúncia a certas leis da selva. A lei de sermos juízes em causa própria. A lei de dominarmos os fracos pela força. A lei de nos apropriarmos indevidamente dos bens de outro. Mas também a lei de o torturarmos para cumprir um qualquer desígnio pessoal ou tribal.
 

Sim, sou capaz de mentir para defender minha mãe. Mas não torturo para protegê-la, desde logo porque nunca saberei se a estarei protegendo ou só mutilando um inocente.
 

Há riscos nessa espécie de absolutismo moral, eu sei. Às vezes, podemos estar errados. Às vezes, o preço a pagar é trágico. Às vezes, o suspeito era realmente cúmplice. Mas quem disse que viver em sociedades civilizadas era fácil?
 

Não é, leitor. Fácil é viver na selva e seguir os instintos dos animais.


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quinta-feira, novembro 25, 2010

A solidão no Facebook

Solidão no Facebook

As redes sociais mascaram a ausência de comunicação entre as pessoas, diz o sociólogo francês Dominique Wolton

MARCOS FLAMÍNIO PERES
DE SÃO PAULO

Agora que o Facebook virou filme e as redes sociais parecem ter liberado o homem para toda forma possível de comunicação, vem um intelectual francês dizer que vivemos sob a ameaça da "solidão interativa".
Dominique Wolton, 63, que esteve no Brasil há duas semanas, bate ainda mais pesado. Para ele, a internet não serve para a constituição da democracia: "Só funciona para formar comunidades" -em que todos partilham interesses comuns-, "e não sociedades" -onde é preciso conviver com as diferenças.
Sociólogo da comunicação e diretor do Centro Nacional de Pesquisa Científica (Paris), ele defende na entrevista abaixo que, depois do ambiente, a "comunicação será a grande questão do século 21". Em tempo: "A Rede Social", de David Fincher, estreia nos cinemas brasileiros no início de dezembro.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/images/ep.gif


Folha - Como vê a internet?
Dominique Wolton -
Faço parte de uma minoria que não é fascinada por ela. Claro, é formidável para a comunicação entre pessoas e grupos que se interessam pela mesma coisa e, do ponto de vista pessoal, é melhor do que o rádio, a TV ou o jornal.
Mas, do ponto de vista da coesão social, é uma forma de comunicação muito frágil. A grandeza da imprensa, do rádio e da TV é justamente a de fazer a ligação entre meios sociais que são fundamentalmente diferentes. Nesse sentido, a internet não é uma mídia, mas um sistema de comunicação comunitário.

Mas e as redes sociais?
Elas retomam uma questão social muita antiga, que é a de procurar pessoas, amigos, amor. São um progresso técnico, sem dúvida, mas a comunicação humana não é algo tão simples.
Porque em algum momento será preciso que as pessoas se encontrem fisicamente -e aí reside toda a grandeza e dificuldade da comunicação para o ser humano.

Então a solidão é um risco nessas redes?
Sem dúvida: a "solidão interativa". Podemos passar horas, dias na internet e sermos incapazes de ter uma verdadeira relação humana com quer que seja.

Isso tem a ver com o conceito que criou -o de "sociedade individualista de massa"?
Sim, porque na comunicação ocidental procuramos duas coisas inteiramente contraditórias: a liberdade individual -modelo herdado do século 18- e a igualdade por meio da inserção na sociedade de massa -que é o modelo do socialismo.
Usamos a internet porque ela é a liberdade individual. Na internet, todo mundo tem o direito de dar sua opinião, mas emitir uma opinião não significa comunicar-se.
Porque, se a expressão é uma fase da comunicação, a outra é o retorno por parte de um receptor e a negociação que implica -e isso toma tempo!
Há um fascínio pela rapidez da internet e por sua falta de controle.
Mas essa falta de controle é demagógica, porque a democracia não é a ausência de leis, mas a existência de leis utilizadas por todos.

A internet foi decisiva para a eleição de Barack Obama?
Acho que se projetou um sonho que não correspondeu à realidade. Obama sempre foi ligado às questões sociais e sabia de sua importância. O que fez foi usar a internet para multiplicar a eficácia dessas relações. Usou a internet de modo bastante clássico.

O Google está nos tornando estúpidos?
Ele está se tornando a primeira indústria do conhecimento, concentrando de forma gigantesca a informação e o saber -o que é um perigo.
Se um grupo de mídia quisesse concentrar toda a distribuição de informação, alguém diria: "Atenção, monopólio!". Mas não se faz isso em relação à internet, tamanho é o fascínio pela técnica na sociedade atual.

O papel está condenado?
Ao contrário! Porque internet é rapidez, livros e jornais são lentidão e legitimidade -informação organizada. A abundância de informações não suprime a questão prévia de que educação é formação.

Texto e entrevista da Folha de São Paulo, de 8 de novembro de 2010.

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quarta-feira, novembro 17, 2010

Mulher cristã é condenada à morte por enforcamento no Paquistão

Um tribunal paquistanês condenou à morte uma mulher cristã, mãe de cinco filhos, por blasfêmia, provocando a revolta de grupos de defesa dos direitos humanos nesta quinta-feira.

Asia Bibi, de 45 anos, recebeu sua sentença ainda na segunda-feira (8) em uma corte do distrito de Nankana, na província central de Punjab, a 75 quilômetros de Punjab.

O Paquistão nunca executou um réu por blasfêmia, mas o caso joga luz sobre a polêmica lei islâmica do país, que incentivaria a ação de extremistas.

O processo de Asia começou em junho de 2009, quando ela foi buscar água enquanto trabalhava no campo. Um grupo de camponesas muçulmanas, no entanto, protestou, afirmando que uma mulher não muçulmana não deveria tocar o jarro d'água do qual elas também beberiam.

Dias depois, o grupo de muçulmanas procurou um clérigo local e denunciou Asia, indicando que ela teria feito comentários depreciativos sobre o profeta Maomé. O sacerdote, por sua vez, procurou a polícia local, e uma investigação foi aberta.

Asia foi presa no vilarejo de Ittanwalai e indiciada sob a seção 295 C do Código Penal paquistanês, que inclui a pena de morte.

O juiz Navid Iqbal, que a condenou à morte por enforcamento, "excluiu completamente" qualquer hipótese de que a ré tivesse sido falsamente acusada, afirmando que não há "circunstâncias atenuantes" no caso, de acordo com o texto do veredicto.

O marido de Asia, Ashiq Masih, de 51 anos, disse que pretende apelar da condenação de sua mulher, que ainda precisa ser ratificada pela corte de Lahore, a mais alta de Punjab, antes de ser executada.

"O caso é infundado e nós entraremos com um recurso", declarou.

O casal tem três filhas e dois filhos.

Segundo ativistas dos direitos humanos e defensores das minorias, é a primeira vez que uma mulher é sentenciada à morte por enforcamento no Paquistão por blasfêmia.

Um casal foi condenado à prisão perpétua no ano passado pela mesma acusação.

"A lei da blasfêmia é completamente obscena e precisa ser derrubada em sua totalidade", disse Ali Dayan Hasan, porta-voz da organização Human Rights Watch (HRW).

Cerca de 3% da população paquistanesa, que chega a 167 milhões de pessoas, é composta por não muçulmanos.


Notícia da France Presse, publicada na Folha.com .

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sábado, novembro 13, 2010

Vista Aérea da Praça da Alfândega com a 56a. Feira do Livro



Em imagem saturada por filtro da câmera Olympus X40.
A Feira do Livro termina nesta segunda-feira, dia 15 de novembro.
Talvez a razão fundamental de ser da Feira do Livro já não exista, ou seja, para comprar livros mais baratos e juntar os vendedores num só lugar já não é necessário que haja a Feira. Hoje temos a Internet, onde podemos adquirir obras até no exterior. E temos as chamadas "mega stores" em Porto Alegre, como é o caso da Saraiva, e da Cultura, as quais oferecem seus próprios programas de descontos aos clientes.
Mas eu sempre acho boa a movimentação que a Feira gera na Praça da Alfândega. E acho que um pena que dure apenas um pouco mais de duas semanas.

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A 56a. Feira do Livro de Porto Alegre entre ruínas

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Ou em obras, visando certa restauração...

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terça-feira, novembro 09, 2010

O pesadelo dos gerentes

O pesadelo dos gerentes


ACONTECE EM TODO lugar, mas videolocadoras são, ou eram até recentemente, as campeãs neste tipo de coisa. Você entra, os funcionários são muito jovens, estão mais interessados na própria conversa do que em atender o cliente, não fazem ideia do filme que você está pedindo e, na hora de pagar com cartão de crédito, o "sistema caiu".
Essa, pelo menos, era minha experiência desde os tempos do VHS e, ao que tudo indica, nos Estados Unidos ocorre o mesmo. Pois o exemplo da videolocadora aparece no capítulo inicial de "Não Tenha Medo de Ser Chefe", livro do consultor de negócios Bruce Tulgan, publicado no Brasil pela editora Sextante.
Por que seriam tão ruins os serviços daquela videolocadora hipotética? A culpa não é dos funcionários, nem do dono da empresa, responde Tulgan. A culpa é do gerente.
A questão, diz ele, é que estamos vivendo uma "epidemia de subgerenciamento". Teorias modernas de administração insistiram exageradamente na ideia de que é preciso delegar funções, atribuindo metas aos funcionários, sem orientá-los e acompanhá-los de perto.
Prêmios, penalidades, ordens precisas, baixa tolerância com a mediocridade: só assim, diz o livro, as coisas vão começar a funcionar.
Volto ao exemplo da videolocadora, entretanto, e penso em outra hipótese. O gerente, de fato, nunca está por perto em estabelecimentos desse tipo. Mas penso no funcionário que me atende.
Não se trata, necessariamente, de alguém com baixo nível de instrução. O que parece predominar nesse tipo de serviço é a figura do empregado temporário, muitas vezes um estudante. Basta você atrasar a devolução do DVD que todas as caras na locadora já mudaram. Provavelmente, o gerente também é outro.
O sociólogo Richard Sennett, em "A Corrosão do Caráter" (ed. Record), dá o exemplo de uma padaria, hoje totalmente informatizada, que ele tinha estudado há questão de 20 ou 30 anos.
O trabalho tornou-se muito menos exaustivo; o ambiente é asséptico como o de um laboratório. Produz-se uma quantidade muito maior e mais variada de pães.
Os empregados, entretanto, perderam comprometimento com a profissão. Não se consideram mais "padeiros". Apertam botões em um computador, cujo funcionamento desconhecem. Sabem que dali a alguns meses arranjarão outro serviço -numa locadora, provavelmente.
Pobre do gerente que quiser "liderar", como se diz, equipes desse tipo. A mão de obra tornou-se transitória como nunca num sistema de produção marcado pela extrema tecnologia. A velha "ética" do trabalhador, tanto na relação com seus colegas quanto com o resultado de seus esforços, pulverizou-se no que, com certa visão moralizante, gosta-se de denominar o "hiperindividualismo" contemporâneo.
O "hiperindividualismo" existe, antes de tudo, porque o próprio trabalho deixou de ser algo coletivo e perdeu o pouco sentido que antes possuía. Como exigir "motivação" de quem não passa de um apertador de botões e passador de cartões de crédito?
Na outra ponta, o alto dirigente tampouco está feliz. Em "O Executivo sem Culpa" (ed. Lua de Papel), João Ermida narra como passou por uma longa síndrome de pânico depois de muito sobe e desce no mercado financeiro. É dos que lamentam a "crise de valores" na sociedade contemporânea.
Infelizmente, para superá-la -adotando comportamento mais sábio e menos imediatista-, não bastam, a meu ver, transformações individuais. Seria preciso, antes de mais nada, avisar a concorrência.
Enquanto isso, o leitor interessado no assunto pode ler "Como Enrolar Seu Chefe", de João José da Costa (ed. Matrix). Entre as recomendações, na aparência humorísticas, mas bastante profundas de seu livro, estão a de tomar o máximo de cafezinhos por dia, participar de tudo quanto é curso de reciclagem, preparar um Power Point "multivalente" para sair dando palestras por aí, entrar em toda reunião inútil. O objetivo, claro, é trabalhar o menos possível.
Por trás de tudo, está o fato de que o trabalho se autoinventa; criam-se funções e projetos para justificar o que nunca teve tão pouco sentido; o desemprego, ou na melhor das hipóteses, o trabalho temporário, é o pesadelo do qual todos, gerentes ou não gerentes, gostariam de acordar.

Texto de Marcelo Coelho, na Folha de São Paulo, de 3 de novembro de 2010.


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quinta-feira, novembro 04, 2010

Primeira mulher rabino em 75 anos é ordenada na Alemanha



Pela primeira vez em 75 anos, uma mulher foi ordenada rabino nesta quinta-feira na Alemanha, marcando a retomada de uma comunidade judaica devastada pela Shoah (Holocausto).

Alina Treiger, 31 anos, originária da Ucrânia, tornou-se sacerdote do culto judaico durante cerimônia emocionante em uma sinagoga do oeste de Berlim, que contou com a presença do presidente, Christian Wulff.

Ela é a segunda mulher ordenada na Alemanha. A primeira, também do mundo, a conseguir o título foi Regina Jonas, em 1935 - assassinada em Auschwitz em 1944, aos 42 anos.

Com cabelos ondulados loiros escuros e um grande sorriso, Alina era o centro das atenções, mesmo que outros dois estudantes rabinos estivessem sendo ordenados ao mesmo tempo.

"Enchamos nossos corações de amor. Estejamos unidos no amor pelo Bem e pela vontade de impedir a violência e o conflito", disse durante uma "oração para a Alemanha" pronunciada ao término de sua ordenação.

No fim de novembro, Alina Treiger deve assumir a direção da comunidade da cidade de Oldenburg, próxima à Holanda.

Ela afirma encarnar "a união de três culturas: judaica, alemã e a da antiga União Soviética". Nascida em Poltava, uma cidade de 300 mil habitantes que hoje pertence à Ucrânia, Alina Treiger estudou no colégio Abraham Geiger de Postdã, próximo a Berlim. Criado em 1999, foi o primeiro seminário rabínico da Europa Continental desde o Holocausto.

A trajetória da jovem mulher é símbolo da comunidade judaica alemã que, das cinzas da Shoah, tornou-se hoje uma das mais dinâmicas do mundo e é 90% composta por membros originários da extinta URSS.

Após a queda do Muro de Berlim, a Alemanha abriu suas portas para os judeus do antigo império soviético, vítimas de um forte antissemitismo, fornecendo a eles a nacionalidade alemã.

"Na Ucrânia, a religião era esquecida pela metade", contou Alina Treiber.Desde 1989, cerca de 220 mil judeus da extinta URSS chegaram à Alemanha que contabilizava, na época, 30 mil judeus, contra cerca de 600 mil antes de Adolf Hitler chegar ao poder em 1933.

Uma boa parte deles partiu, principalmente para Israel. As comunidades judaicas na Alemanha contam hoje com 110 mil membros, quatro vezes mais do que há 20 anos, segundo o Conselho Central de Judeus da Alemanha.

Essa migração em massa permitiu em algumas regiões, principalmente da ex-República Democrática Alemã, a recriação das comunidades aniquiladas pelo Holocausto.

Em Berlim, a comunidade judaica conta 11 mil membros, dois terços derivados da eentão URSS.

No entanto, a integração desses judeus vindos da União Soviética levanta problemas e suscita conflitos. Alguns judeus alemães os acusam de serem "desjudaizados".

A chegada desses refugiados teve fim no dia 31 de dezembro de 2004, quando a Alemanha impôs restrições à migração deles. O número de candidatos começou a cair drasticamente.

A ordenação, chamada semikha, é acessível às mulheres unicamente no judaísmo liberal. As raras mulheres rabinos estudaram, em sua maioria, nos Estados Unidos.

"É um dia extraordinário!", entusiasmou-se o rabino Daniel Freelander, vice-presidente da União do Judaísmo Progressista da América do Norte. As primeiras ordenações de rabinos na Alemanha depois do Holocausto ocorreram em 2006.


Notícia da AFP, no Terra. Foto com crédito para a AFP.


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quarta-feira, novembro 03, 2010

Mary McCartney

Eu vi esta foto na capa do suplemento Donna, no jornal Zero Hora (31/03/2010) e gostei. Foto de Chris Jackson, para Getty Images.

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Já esta, eu procurei no Bing. Foto de Dan kitwood, para Getty Images.

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Al-Qaeda anuncia fim de ultimato e considera cristãos "alvos legítimos"

A Al-Qaeda no Iraque anunciou nesta quarta-feira que os cristãos são "alvos legítimos", depois do fim do ultimato à igreja copta do Egito para libertar duas mulheres, informou o Centro Americano de Vigilância de Sites Islamitas (SITE).

Ao reivindicar o ataque contra uma igreja de Bagdá no domingo, o Estado Islâmico do Iraque (ISI) deu prazo de 48 horas à Igreja copta do Egito para libertar duas cristãs convertidas ao islã que segundo a organização estão "encarceradas em mosteiros" deste país.

"O ultimato expirou (...) Portanto, todos os centros, organizações, instituições, dirigentes e fiéis cristãos são alvos legítimos para os mujahedines, onde puderem ser alcançados", afirma um comunicado.

No ataque de domingo contra a catedral siríaca católica de Bagdá, 46 fiéis morreram e 60 foram feridos. Sete integrantes das forças de segurança também faleceram na invasão para acabar com a tomada de reféns.


Notícia da AFP, republicada no UOL.

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Sobe para 52 número de mortos em ataque à igreja em Bagdá; 67 ficaram feridos

Cinquenta e duas pessoas, entre civis e policiais, foram mortas no domingo (31) quando forças de segurança invadiram uma igreja de Bagdá para libertar mais de cem católicos iraquianos mantidos reféns por homens armados ligados à rede Al Qaeda, disse um vice-ministro do Interior, general Hussein Kamal, acrescentando ainda que 67 pessoas ficaram feridas na ação.

"Esta cifra de mortos inclui civis e membros das forças de segurança. Não diferenciamos entre civis e membros das forças de segurança", disse Kamal, acrescentando que o número não inclui os agressores mortos.

Os extremistas invadiram a igreja Nossa Senhora da Salvação, uma das maiores de Bagdá, durante a missa de domingo e exigiram a libertação de todos os prisioneiros da Al Qaeda no Iraque e no Egito.

Tiroteios esporádicos ocorreram por várias horas no bairro de Karrada, próximo da região de segurança reforçada conhecida como Zona Verde, onde se concentram as embaixadas e edifícios governamentais.

Helicópteros militares dos EUA e do Iraque sobrevoavam a área, isolada pelas forças de segurança.

Testemunhas disseram à televisão local que homens armados, possivelmente usando cinturões com explosivos, forçaram a entrada na igreja no domingo e mataram pelo menos um padre.

Autoridades disseram que eles ameaçavam matar os 120 reféns mantidos no local se não fossem libertados todos os prisioneiros da al Qaeda no Iraque e no Egito.

O grupo Estado Islâmico do Iraque, vinculado à Al Qaeda, assumiu a responsabilidade contra a igreja, que chamaram de "toca suja da idolatria, e deu o prazo de 48 horas para a Igreja do Egito libertar os muçulmanos "presos nos mosteiros" do país, afirmou o centro americano de monitoramento de sites islâmicos (SITE).

BOLSA

O episódio começou quando o grupo armado tentou entrar na Bolsa de Valores de Bagdá, localizada em frente à igreja católica. A polícia informou que seis pessoas foram mortas ali, incluindo dois policiais, e os agressores rumaram à igreja, onde uma missa era celebrada.

Moradores da região disseram ter ouvido explosões e trocas de tiros.

Os militantes diziam ser do Estado Islâmico do Iraque, grupo sunita supostamente ligado à Al Qaeda.

Há relatos de que os agressores não eram iraquianos, mas árabes de países vizinhos.

Há cerca de 1,5 milhão de cristãos no Iraque. Muitas igrejas foram bombardeadas nos últimos anos, mas acredita-se que esta tenha sido a primeira vez que cristãos foram feitos reféns.

IMPASSE POLÍTICO

A segurança iraquiana é prejudicada pelo impasse político que domina o país desde as eleições gerais de março, que não tiveram um vencedor claro.

Neste domingo, a imprensa iraquiana noticiou que o bloco político Dawa, que representa parte da comunidade xiita do país, planeja recusar um convite do rei saudita Abdullah para conversas cujo objetivo seria ajudar na formação de um novo governo.

O partido, do atual premiê iraquiano Nuri al Maliki agradeceu a oferta de Abdullah, mas disse que o Iraque é capaz de resolver sozinho suas diferenças.

Comentário semelhante foi feito por Mahmoud Osman, representante dos curdos. Mas o bloco de maioria sunita, liderado pelo político secular Ayad Allawi, agradeceu a oferta saudita.

O presidente iraquiano, Jalal Talabani, a quem a oferta de Abdullah foi oficialmente dirigida, ainda não deu uma resposta formal.


Notícia da Reuters, na Folha.com .

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Arqueologia vira arma política em Israel

Arqueologia vira arma política em Israel

Descobertas questionáveis de relíquias são usadas por nacionalistas para reforçar ocupação de áreas palestinas

Da mesma forma, palestinos negam que tenha havido templos antigos do judaísmo na cidade de Jerusalém

MARCELO NINIO
DE JERUSALÉM

Com o Velho Testamento numa mão e a réplica de um antigo selo hebreu na outra, o jovem guia israelense incendeia a imaginação do grupo de turistas em Jerusalém.
"Aqui, estão as ruínas do palácio de Davi. Aqui, os profetas Jeremias e Isaías disseram suas palavras eternas", diz ele, diante das escavações na Cidade de Davi, parque multimídia que atrai 400 mil visitantes por ano.
Situado no bairro árabe de Siluan, um dos pontos mais sensíveis do conflito palestino-israelense, o parque também se transformou em foco de intensa polêmica no mundo da arqueologia.
Para muitos estudiosos do assunto em Israel, há abuso político da arqueologia no local para justificar o direito histórico dos judeus sobre a terra e o desalojamento de residentes palestinos.
No centro da polêmica está uma organização privada chamada Elad, também conhecida como Fundação Cidade de Davi, que controla as escavações em Siluan.
Criada por David Beeri, ex-comandante de uma unidade militar de elite, a Elad tem o objetivo declarado de aumentar a presença de judeus em Siluan.
Para isso, conta com doações de judeus milionários do exterior e as bênçãos do governo israelense e da prefeitura de Jerusalém.
O bairro fica na área de Jerusalém ocupada por Israel em 1967 e que os palestinos veem como parte de sua futura capital.
Aumentando a sensibilidade, a poucos passos dali está o ponto nevrálgico da disputa religiosa: Monte do Templo para os judeus, onde teriam sido erguidos e destruídos os dois templos sagrados, Esplanada das Mesquitas para os muçulmanos, onde o profeta Maomé teria subido aos céus.

NACIONALISMO
Com ordens judiciais ou comprando propriedades por meio de terceiros, a organização Elad instalou cerca de 500 colonos, cercados de forte segurança, no meio da população de 45 mil palestinos de Siluan, criando um foco de tensão permanente.
A arqueologia reforça o argumento dos colonos. Para eles, a "Bacia Sagrada", como também é conhecido o vale de Siluan, faz parte inseparável da história judaica.
Foi dali, afirmam, que o rei Davi unificou as tribos e converteu Israel num império, três milênios atrás.
Doron Spielman, porta-voz da Elad, não esconde a ligação entre arqueologia e nacionalismo. Ele explica que soldados israelenses são levados à Cidade de Davi para entender que a fundação de Israel representa a volta do povo judeu a sua origem.
Nos últimos anos, arqueólogos identificados com a direita exibiram descobertas que comprovariam as histórias da Bíblia, principalmente da época de Davi.
O caso mais proeminente é o de Eilat Mazar, da Universidade de Jerusalém. Em 2005, ela anunciou ter achado uma parede do palácio de Davi.
Neste ano, voltou ao noticiário ao encontrar resquícios de uma construção que diz ter sido obra do rei Salomão, no século 10 A.C.
Tais achados são questionados pela maioria dos arqueólogos de Israel, muitos deles frustrados com a inclusão da disciplina na agenda da direita nacionalista.

RELÍQUIAS NO ENTULHO
"Que deixem Abraão, Davi, e Salomão descansar em paz", diz Yoni Mizrahi, diretor do grupo Emek Shaveh, que prega a separação entre arqueologia e política. "A arqueologia não pode ser usada para provar posse".
A disputa pelo passado se estende ao outro lado do conflito. A liderança palestina nega que um dia existiram os templos sagrados do judaísmo em Jerusalém.
Em 1997, o fundo islâmico Waqf, que administra a Esplanada das Mesquitas, causou revolta em Israel ao retirar toneladas de terra do local numa escavação secreta. Mais tarde, foram achadas relíquias arqueológicas no entulho.
"Há absurdos de ambos os lados. Não há santos em Jerusalém", diz Israel Finkelstein, um dos mais respeitados arqueólogos israelenses. "Pelo bem da ciência, é preciso tirar a arqueologia do campo minado da política."

Notícia da Folha de São Paulo, de 1º de novembro de 2010.


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