domingo, janeiro 06, 2008

Viver com as Imagens

Aos 26 anos de idade, Adolfo Bioy Casares (foto) escreveu seu primeiro romance, “A invenção de Morel” (publicado no Brasil pela Cosac Naify, com tradução de Samuel Titan Jr., prólogo de Jorge Luís Borges e posfácio de Otto Maria Carpeaux). Para Borges, uma ficção de índole policial. Para Carpeaux, uma história de ficção científica que trata da construção de uma máquina fantástica. Escrito em 1940, em plena Segunda Guerra Mundial, o livro de Casares é um bom texto para iniciar 2008, em um mundo saturado cada vez mais pela imagem e pelas fantasias de potência e imortalidade a um preço bem baratinho. Ao refletir sobre a invenção de Morel, o narrador afirma:

“Viver com as imagens é uma felicidade! A eternidade rotativa (das imagens) pode parecer atroz ao espectador, é satisfatória para seus protagonistas. Livres de más notícias e de enfermidades, vivem sempre como se fosse a primeira vez, sem recordar as anteriores. Para as imagens não existe uma próxima vez (todas são iguais à primeira)”.

“O fundamento do horror de ser representado em imagens, que alguns povos sentem, está na crença de que, ao se formar a imagem de uma pessoa, a alma passa para a imagem e a pessoa morre” (...) “Seria o caso de inventar um aparelho que permita averiguar se as imagens sentem e pensam – ou, ao menos, se têm os pensamentos e as sensações que passaram pelos originais durante a exposição; é claro que não será possível averiguar a relação de suas consciências (?) com esses pensamentos e sensações”.

Borges resume o argumento do livro de Bioy Casares com um trecho de uma música de Dante Gabriel Rossetti:

Estive aqui antes,

Mas quando e como não sei.

Conheço a relva além da porta,

O perfume doce e penetrante,

As luzes pela costa, os sons murmurantes...

No mundo espetacular das imagens, há cores, formas, sons e odores. Só falta a consciência da presença, da mortalidade. É um mundo povoado pela ausência e por uma fracassada ambição de imortalidade. Sem a consciência de si mesma, a imagem assume a forma de um fantasma a flanar pelo mundo, descolado daquilo que foi um dia (ou que poderia ter sido).

Marco Aurélio Weissheimer, no RS Urgente, em momento filosófico-literário.


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2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Grande Zé:
Ainda estou de férias, mas cavei um tempinho pra vir aqui te desejar um Feliz Anovo Novo e agradecer as palavras gentis lá na minha toca.
Um abraço.
Em 2008, arriba!

10:07 PM  
Blogger José Elesbán said...

Valeu, Jens!

11:54 PM  

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