O caos informativo em perspectiva
Carlos Castilhos
A questão do caos informativo mereceu comentários de vários leitores do post anterior. Como se trata de um tema complexo vale a pena aprofundar a troca de idéias, porque ele já está afetando a nossa forma de perceber o noticiário da imprensa, como mostrou o caso Paula.
A palavra caos ganhou uma conotação negativa ao longo dos últimos anos ao ser associada a confusão, desorientação e desordem num contexto onde a ordem e a disciplina eram conceitos acima de qualquer dúvida.
Mas no ambiente atual, marcado pela transição da era analógica para a digital (não apenas na TV), a expressão está associada cada vez mais à idéia de complexidade e ausência de consenso. É justamente esta percepção que um número crescente de consumidores de informações começa a ter ao ler o noticiário sobre a crise econômica, por exemplo.
A cada dia surgem versões novas e geralmente contraditórias. Notícias otimistas se alternam com as pessimistas. O que parecia certo num momento deixa de sê-lo no seguinte, devido ao surgimento de um dado mais recente. Este fenômeno não é novo. O inédito é a sua intensidade e complexidade. Daí a nossa sensação de perplexidade e desorientação.
Tudo isto acontece porque a internet e a digitalização eletrônica geraram uma avalancha de informações depois que ficou muito fácil e barato publicar dados, notícias e fatos na Web. Os dados desta avalancha impressionam:
a) Estima-se que, só em 2008, foram publicados na Web documentos que dariam para encher 70 mil novas Bibliotecas do Congresso norte-americano, a maior do mundo, com um acervo (em 2002) de 17 milhões de livros;
b) Outra estimativa, garante que no ano passado, o total de documentos novos digitalizados na Web dividido pelos 6,76 bilhões de habitantes do planeta (em março de 2009) daria para cada ser humano uma pilha de livros de 32 metros de altura (um edifício de nove andares)[1]
Estes números impactam não apenas pelo seu significado atual mas principalmente porque eles tendem a crescer, na medida em que a internet está em ampliação contínua. Com base nisso fica fácil perceber que a complexidade informativa tende também a aumentar.
A base deste aumento de complexidade está num raciocínio matemático simples: quanto mais pessoas ingressarem na rede produzindo informações, mais complexa ela se torna. Uma rede de cinco pessoas tem 10 conexões informativas possíveis. Uma rede de 10 pessoas, passa a ter 45 conexões. E se o conjunto subir para 15 membros, eles passam a ter 105 conexões possíveis, como vocês podem ver no gráfico.[2]
A complexidade da rede aumenta de forma muito mais rápida que o número de participantes. Se levarmos em conta que estas conexões são basicamente informações sendo passadas de uma pessoa para outra, dá para ter uma idéia aproximada do que é este tal de caos informativo, já que cada pessoa tem uma percepção diferente porque sua forma de captar a realidade depende de fatores como perfil psicológico, experiência de vida, estado emocional no momento da ação, interesses em jogo, grau de educação etc.
O gráfico com 15 pessoas em rede já é complexo. Imagine-se se formos tentar desenhar um com quase um bilhão de internautas, o número aproximado de pessoas com acesso à internet em todo mundo, hoje. Neste contexto, a palavra caos ganha outra percepção. Não se trata mais de desordem, mas de uma situação complexa diante da qual não adianta fechar os olhos e tentar esquecê-la. É o nosso desafio atual tentar descobrir como conviver com ela.
[1] Estimativas calculadas com base nos dados publicados em 2003, pelo estudo How Much Information, da Escola de Sistemas e Gerência da Informação, da Universidade da Califórnia (Berkeley).
[2] Imagem reproduzida do livro Here Comes Everybody, de Clay Shirky, página 27 .
Texto original do Observatório da Imprensa.
Marcadores: informação, Internet, Web
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