O pagador do sucesso
O pagador do sucesso
RIO DE JANEIRO - São frequentes os atores de cinema que se transformaram em bons diretores. Os casos mais notáveis seriam Chaplin e Orson Welles, passando por Vittorio De Sica, que começou como galã do cinema italiano e terminou como diretor de obras-primas, como "Ladrões de Bicicletas", "Umberto D" e "Milagre em Milão".
Anselmo Duarte, em nível nacional, lembra sobretudo De Sica. Quando estreou na direção, com "Absolutamente Certo", a crítica reconheceu que o eterno galã das chanchadas da Atlântida tinha jeito para a coisa, o filme ficava acima da produção daquela época. Mas era, ainda, uma extensão mais ou menos séria dos filmes populares que então eram feitos no Brasil.
Veio depois o impacto de "O Pagador de Promessas", que, antes mesmo da Palma de Ouro de Cannes, foi considerado um dos melhores filmes nacionais de todos os tempos. O prêmio internacional, paradoxalmente, se não fez mal ao filme, fez mal a seu diretor. Anselmo passou a ser negado não só pela crítica mas pelos colegas de ofício, notadamente o pessoal do cinema novo, que então começava a despontar.
Tentando desqualificar a Palma de Ouro, foi dito que o júri daquele ano dividira-se entre Buñuel e Antonioni, dois cobras assumidos do cinema internacional. Anselmo teria aproveitado a brecha e, namorando a presidente dos jurados, foi o tertius que levou a Palma e a sua alma.
Nunca se recuperou do trauma em sua própria terra. Funcionando sempre de olho nos prêmios internacionais, principalmente no de Cannes, os cineastas e produtores nativos eram unânimes em negar não só o filme mas, sobretudo, o diretor. Ensaios e livros são pródigos em elogiar os filmes do cinema novo, mas colocam uma pedra do silêncio em cima de Anselmo Duarte.
O texto é de Carlos Heitor Cony, na Folha de São Paulo, de 10 de novembro de 2009.
O ator e diretor de cinema, Anselmo Duarte, faleceu no final de semana passado. Foi o único diretor de cinema brasileiro vencedor de Cannes até agora. Mas pelo que dizem os necrológios, isto talvez lhe tenha feito mais mal que bem na época, e, a partir de então, na vida e obra de Anselmo Duarte.
Marcadores: Arte, Brasil, Carlos Heitor Cony, cinema, falecimento
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